“Certo dia encontrava-se São Rafael trabalhando na cozinha quando, repentinamente, uma luz penetrou-lhe a alma impelindo-o a exclamar: “O que faço eu, Virgem Santa? Descascar nabos! Descascar nabos… para quê? “
SÃO RAFAEL ARNÁZ BARÓN, Escritos op. cit., n.787
E o coração pulando no peito contestou-lhe sem refletir: “Eu descasco nabos por amor a Cristo!”.
Veio-lhe então uma paz muito grande no mais fundo da alma, acompanhado pela ideia: “O mero fato de pensar que no mundo se pode fazer das menores ações da vida, atos de amor a Deus; que o fechar ou abrir um olho em seu nome, nos pode levar a obter o Céu; que descascar nabos por verdadeiro amor a Deus, pode dar tanta glória a Ele e a nós tantos méritos, como a conquista das Índias; […] É algo que enche a alma de alegria!”.
E conhecidos: “Na realidade para ganhar o Céu nos é pedido muito pouco”, pois, como afirma Santa Teresinha do Menino Jesus, Deus “olha mais para a intenção do que para o valor da ação”.”
Nestes dias deparei-me com esse trecho, retirei de uma página dedicada ao Santo trapista Rafael Arnáz, no qual particularmente nutro grande carinho devido à simplicidade de seus ensinamentos, o grande amor e abandono a vontade de Deus. A principio ia somente compartilha-lo na minha rede social, mas algo me chamou atenção, penso que esse “estalo“, esse momento de descoberta sobre descascar nabos por amor a Cristo poderia alcançar mais pessoas e ajudar-nos a ter um olhar atento no modo no qual realizamos nossas tarefas, afinal de contas trabalhamos, estudamos, nos socializamos, fazemos muitas coisas o que não é ruim em si mesmo, porém fazemos tudo de forma desatenta, estamos desnorteados e por vezes quando fazemos algo aparentemente comum, ou insignificante, aos nossos olhos, não sabemos aproveitar seu verdadeiro valor enquanto realizamos tantas coisas ao longo do dia, porém estas mesmas são desperdiçadas, que lástima…
São Rafael não estava no coro a rezar, ou recitando a liturgia das horas, ou na Santa Missa, ele estava a trabalhar na cozinha, e mesmo no seu trabalho ele mantém um diálogo com a Virgem Maria exclamando o “pra quê” ele estava a descascar nabos, qual mérito teria sua ação, de que isso valeria — afinal ele é monge e ali está para rezar também pelas almas. Mas ao dialogar com essa Mãe Bendita que não cessa de nos socorrer e que está disposta a nos aproximar de Seu Filho, ele obtém a resposta e brilha diante de si o “óbvio”: por AMOR a Cristo, pronto! Não é descascar aqueles nabos, o ofício em si mesmo, mas o modo: que é simplesmente fazer o pouco que fazemos cada um segundo sua vocação, puramente no amor, por amor e para o amor¹ e que alegria a paz verdadeira nos vêm à alma quando colocamos nossas intenções nos ‘trilhos’. Porque também somos chamados por amor a Cristo a limpar a casa, lavar louça, recolher brinquedos espalhados, a cozinhar, a organizar as planilhas, a realizar nosso trabalho a viver nossa vida, por amor e para o amor; o monge tem por vocação dar-se inteiramente a Deus, oferecer-se pelas almas, rezar por nós e essa era a vocação de São Rafael, mas, além disso, o seu maior chamado era Amar a Cristo, este também é o nosso maior chamado.
Não significa, porém que isso será feito com suspiros e arroubos, não, isso será feito com certa dificuldade e teremos de nos empenhar, pois tendemos, principalmente quando temos o habito de fazer a mesma coisa, a cair no relaxamento, a fazer por fazer, podemos deixar cair no esquecimento que estamos diante da presença de Deus, não só quando estamos na missa, ou rezamos o terço, mas continuamente, parece obvio, mas infelizmente o obvio tem de ser dito, daí que desanimamos que deixamos passar inúmeras oportunidades de amar a Deus, de progredirmos espiritualmente.
São Rafael descobriu que era tudo por amor a Cristo, entendeu até que o fechar ou abrir um dos seus olhos em seu nome, nos pode levar a obter o Céu. Ele, como citei nos parágrafos anteriores descobriu o segredo escondido, ele não fugiu, tampouco deu desculpas “ah, mas sou monge deveria estar no coro a rezar”, não, ele realizou seu trabalho na cozinha, sem brilho, nem gloria, para glorificar a Deus, porque sua vocação e a nossa também não é num “checklist”, mas é um conformar nossa vontade a de Deus, é aprendermos a sermos generosos, entender que se as pequenas obras são estimuladas com a virtude do santo amor, e estão em bom odor diante da majestade de Deus, em consideração a elas, Ele aumenta a santa caridade². Deus fala conosco em nossa circunstância, se Ele quer falar conosco quando estamos a “descascar nabos” que assim seja, parece complicado, mas não é, porque de fato nos é pedido muito pouco para ganhar o céu, quando é por amor que vivemos, o que fazemos adquiri brilho, beleza, nossa vida torna-se fecunda.
Que a Virgem Maria nos ajude a termos um puro amor a Deus e a estarmos atentos a sua Doce Voz, para que possamos então com coração enamorado em tudo aquilo que fizermos e no final de nossa vida exclamar: “É por amor… Foi por amor”!
São Rafael Arnáz, rogai por nós!
1. (Sermon pour le I dimanche de Carême, IV, 230).
2. (Amour de Dieu, I, III, cap. II, I, 457).
É no pouco que se revela o muito!
Belo texto, JAque!