Falta de tempo, ou de amor…?

Falta de tempo, ou de amor…?

 “A ociosidade é inimiga da alma” é o que foi regido por São Bento em sua regra, no ponto que é dito sobre ‘trabalho manual quotidiano’, basicamente, ele deixa claro para seus monges que se deve evitar o ócio, por meio da lectio divina, ou leitura espiritual, ou meditação, ou como ele mesmo diz “caso o irmão for tão negligente e preguiçoso que não queira ou não consiga meditar ou ler, deve receber alguma obra manual para que não fique ocioso” e ainda para mostrar, creio eu, não só a importância do trabalho manual para os monges, mas também o mal que causa o ócio para alma. O santo diz em sua regra “quem faz isso ­– se entrega ao ócio, preguiça – prejudica não somente a si mesmo, mas corrompe os outros”. Sim, hoje meditaremos sobre a ociosidade ou a famigerada ‘preguiçinha’.

  • Ociosidade significa: indolência, moleza, preguiça. O ócio é uma fadiga da alma, fazendo-nos fugir do cumprimento de nossos deveres, a sermos negligentes, corrompendo não somente a nós mesmos, mas o nosso próximo, abrindo a porta para outros pecados, e aumentando as más inclinações e consequentemente impedindo nosso progresso espiritual, vamos vivendo a nosso bel prazer, sem forças para lutarmos, sem ânimo para amarmos e nos fazendo adiar até mesmo nossa conversão.

 Precisamos saber a hierarquia das coisas e bem organizá-las, pois temos a realidade na qual podemos colocar as coisas, nós ou outros em primeiro lugar, consequentemente, tudo virará bagunça, mesmo parecendo que não, e quem devemos amar, quem deve estar em primeiríssimo lugar em nossa vida é Deus. Como no primeiro mandamento, devemos ama-Lo sobre todas as coisas: de todo coração, de toda alma, de todo o espírito e com todas as nossas forças. Se buscamos ama-lo, viveremos melhor, aprenderemos dispor de tudo por amor a Ele, a lidar com frustrações, a amar nosso próximo, pois Ele é bom mestre, é o Bom Deus que ajuda as almas de boa vontade que se apenham em agrada-lo.

Acontece que nos apegamos e damos demasiada atenção a coisas que pode ser necessária, mas é um meio e não fim, ao invés de usar os meios para o fim, que é Deus. Os meios se transformam no fim, e nessa bagunça toda enchemo-nos de tantas atividades para fazer que no final damos a mesma desculpa “não tive tempo”, “fiz tanta coisa hoje”, “estou cansado”, “não dá”, “não consigo” e sem perceber Deus vai ocupando o segundo lugar, o terceiro e quando nos damos conta O esquecemos; “ora” – talvez você pense – “mas não estou sendo preguiçoso(a), estou trabalhando, tenho que estudar. O que tudo isso tem a ver com preguiça, etc., etc.”… Como disse de fato estes são meios que precisamos e não fins, quem deve ocupar o primeiro lugar, ou pelo menos deveria, é Deus, Ele deve ser o centro de nossas vidas e por isso o que fazemos deve nos conduzir a Ele. O ‘lema’ de São Bento é justamente “Ora et labora” ora e trabalha, mas notem que a oração antepõe ao trabalho, como era expresso por São Cipriano “nada se anteponha Cristo, pois Ele nada antepôs a nós”.

Que triste saber que antepomos tantas coisas a Cristo, Ele que nada antepôs para nossa salvação…  

Li um texto interessante sobre preguiça, e me chamou muita atenção porque ao lê-lo pude ver algumas consequências que pode passar despercebidas que nem ao menos sabemos que possa ser preguiça, como o ativismo. O trabalho dignifica o homem e é um meio de santificação, como já citei, o problema é quando vamos enchendo-nos de tantas tarefas, temos o dia cheio para tudo, e não temos tempo para a oração, para Deus, nos dispomos a muitos afazeres que podem esperar que não são prioridades, ou inventamos qualquer coisa para não evitar o silêncio, para não parar, não rezar, parece que tudo é mais importante menos estar com Deus, e no final temos a “bela” justificativa “tenho tantas coisas a serem feitas, não tenho tempo!”;

Tem também a ordem defensiva a ordem é uma virtude, precisamos de uma rotina justamente para dispor melhor do dia, no cumprimento dos deveres, para servir o próximo e para melhor amar a Deus. O tempo da oração deve estar pautada sob a ordem oblativa, e não defensiva, e é importante saber que se algum imprevisto me ocorre ou se algo muda o plano d’Ele é melhor que o meu e ali poderei exercer as virtudes que tanto peço em oração, a ordem é uma virtude, um meio para chegar ao fim, e não deve ser uma forma de defesa, intocável, onde fico na mesmice, onde não aceito contrariedades.

Em contrapartida há algo perigoso que é o simplesmente ficar sem fazer nada esse é mais simples de reconhecer e abre espaço para a impureza, não à toa que quem sofre com imaginário afetado pela pornografia, ou tende a impureza de pensamentos, um dos conselhos que é dado que vai além da confissão e da oração é o trabalho manual, “a mente vazia é oficina do diabo” – já ouvimos muito, é importante ter uma ocupação, buscar ser útil e o trabalho é um ótimo meio para esse tipo de ócio, ou seja, evitar ficar à toa, como diz São Bento, busque uma leitura, estudo, ocupar-se com coisas santas e puras, ou simplesmente trabalho manual como já foi dito.

Nosso corpo quando entregue a preguiça, por mais inofensiva que pareça, torna-se como uma criança mimada que chora e esperneia ao menor sinal de esforço, que reclama por nada ou por muito pouco, e por isso é facilmente carregado pela correnteza, que caminha como quem carrega um grande fardo, o que é dito sobre a Vida de S. Bernardo, um grande ensinamento que podemos e devemos trazer para nossas vidas: “se é preciso amar seu corpo, ele o ama como a um próximo, que é preciso, portanto amar como a si mesmo, mas no fim das contas, não se trata realmente de “si mesmo”. E é ao corpo que ele diz “tu és terra e a terra retornarás” e ele mesmo ensina “o corpo é um estorvo, um incessante entrave, por suas necessidades aos exercícios espirituais. Ele (o corpo) nos arrasta para baixo” e finaliza “só gosto do meu corpo por causa da minha alma”, de fato a porta é estreita, se mimamos nosso corpo demais só nos causara danação e se o apertar demais sufoca-o, devemos fixar em Deus nosso olhar.

Não sei em qual as consequências a preguiça tem tido espaço na sua vida, talvez use a da “aparência da pessoa cheia de compromissos”, ou na ordem não como virtude, mas “defesa” ou talvez pelo “descanso” do dia, tarde ou noites desperdiçadas enfrente de telas – nos enganamos achando que isso é descanso – nas inúmeras desculpas em deixar para depois, para amanhã, mas veja para “cada preguiça” há um remédio, é preciso arregaçar as mangas e usar os meios que é dado, é necessário também mortificação, oração, coragem. Será que todas as vezes que me desculpei dizendo que “não conseguia” sendo que nem tentei; “to cansado”, mas não para passar horas a fio no celular, jogos ou TV; “não tenho tempo” será mesmo ou não quis priorizar a Deus. Será que essas desculpas são justas, verdadeiras, ou infelizmente é falta de amor a Deus? Não tive tempo, ou não O amei?

Precisamos ser como o grão de trigo que morre para que produza seus frutos, extirpar de nossas vidas reclamações, desculpas e ter diligencia priorizar a Deus e dispor da melhor forma o nosso dia, cumprir com zelo o dever de estado, e não ter medo de se gastar por amor para o amor, é dito que quem ama sempre da um jeito, se amamos e buscamos amar cada vez mais a Deus daremos sempre um jeito de estar na sua presença e de dar provas desse amor, e isso ensina bem São Bernardo:

Vocês querem saber de mim e em qual medida é preciso amar a Deus? Eis a minha resposta: o motivo de nosso amor por Deus é ele mesmo, a medida de ama-lo é ama-lo sem medida […] Deus merece ser amado e é vantajoso amar a Deus [“…]”.

Vida de São Bernardo de Claraval.

Olhemos para vida de Cristo, que foi trabalho, sofrimento, entrega contínua, esvaziamento de si, não havia preguiça ao pagar o preço de nossa redenção, meditando sua paixão nesse tempo propício saberemos quem devemos ser e como agir!  São Bento e São Bernardo de Claraval, rogai por nós!

FONTE: Vida de São Bernardo de Claraval

A regra de São Bento

https://padrepauloricardo.org/blog/eu-preguicoso

PINTURA: The Angelus, Jean-François Millet (1857-1859)